- Mas se contar terei que matá-lo.
*Na literatura várias obras mencionam esse aspecto: O Duplo de Dostoievsky; O Homem duplicado de Saramago; Fausto de Goethe: (aqui o personagem Mefisto inteligente e sedutor, se transforma em espelho para o lado obscuro de Fausto e o corrompe por meio do desejo e de poder). O Retrato de Dorian Gray, de Oscar Wilde: (que mostra a duplicidade do personagem Gray e denuncia sua imperfeição e farsa).
*Cientistas do comportamento humano concordam que as questões existenciais nos levam a lidar com o nosso narcisismo quando nos deparamos com a finitude e a precariedade da vida.
*Segundo Freud, fica bem guardado tudo que é estranho, os aspectos mais primitivos de nossa mente.
*Freud, ao falar de narcisismo nos diz que a criança primeiro toma a si mesmo como objeto de amor e centro do mundo, antes de se dirigir aos objetos externos.
*O narcisismo é uma fase inicial do desenvolvimento, que depois pode levar ao ego ideal.
*Algumas pessoas ficam fixadas a esta fase do desenvolvimento, não conseguindo se ligar a outras, o que as impossibilita vivenciar um relacionamento amoroso.
*O duplo surge quando não conseguimos tolerar nossa realidade psíquica interna e dar conta de nós por inteiro, com nossas limitações, imperfeições e até aspectos que não aprovamos muito em nós.
*O “duplo”, que é fruto também de algo reprimido e deslocado para fora, fruto da onipotência para a realização de desejos e também à onipotência de pensamentos.
***Sobre O Retrato de Dorian Gray: Dorian, herdeiro de uma casa do avô chega a Londres.
*Inicialmente, um rapaz jovem de rara beleza, ingênuo e frágil que se vê encantado com a cidade e o as possibilidades que ela oferece.
*Conhece o Pintor Basil, que se sente atraído pela beleza de Dorian, pinta o seu retrato e se apaixona pelo jovem.
*O Retrato fica perfeito e deixa as pessoas encantadas.
*Dorian também se apaixona pela sua imagem no retrato, ficando preso à própria imagem.
*Basil o apresenta a Henry, que se torna um grande amigo e “conselheiro” de Dorian.
*Henry apresenta o mundo a Dorian pela ótica do prazer e da intensidade das paixões (...) “A vida é só um momento. Você perde a vida por bom senso”, ou, “O homem quer ser feliz, mas a sociedade quer que ele seja bom”, e ainda:“Você quer ser bom?” (...) “consciência ou covardia”, “Procure sempre novas sensações”.
(...) E Dorian fica totalmente manipulado por Henry, seguindo os prazeres imediatos e superficialidade dos contatos.
*Henry questiona com Dorian se ele não faria um pacto para não envelhecer, e ele o faz.
*(...) Enfim, observamos que Dorian vivia a onipotência da imortalidade, que nada poderia abalar sua vida.
*Ele não envelheceria, não sofreria, e para que isso acontecesse, tudo de ruim estaria no quadro.
*E Dorian conseguiu viver este duplo com o pacto demoníaco.
*Após o pacto a ingenuidade vai desaparecendo dando lugar a arrogância e onipotência.
*Dorian assassina o amigo Basil e esconde o corpo.
*Dorian conhece Sybil: A mulher pela qual se apaixona, ainda assim a trata com cinismo e ela grávida e abandonada se mata.
*No final da história quando Dorian retorna da viagem que fez, após ter cometido o assassinato de Basil, todos os personagens envelhecem, menos ele, e parece que ele não se abala com isso.
*Todos ficam hipnotizados pela sua imagem, e isso parece não perturbá-lo. Aqui fica claro o seu sentimento de superioridade em relação aos demais.
*Já Henry, que de inicio se divertia, no final parece perceber e se assustar com o que criou, aqui a criatura ficou pior do que o que o seu criador.
*Henry fica preocupado quando vê que sua filha se apaixona por Dorian.
*É neste momento que tudo se rompe. O amor quebra o pacto. Dorian teve dois amores, mas no primeiro, ele mostrou que era mais apaixonado por ele e pela sua vida, do que pela mulher amada.
*Seu narcisismo, sua arrogância e onipotência foram aparecendo a ponto de não o deixar se ligar verdadeiramente à mulher amada.
*Dorian parece estar envolvido amorosamente, mas sofre por não poder ter uma intimidade total, porque uma parte sua estava no quadro e ele não queria que ela descobrisse; ela por sua vez sabia que tinha algo diferente.
*Podemos pensar que com o seu narcisismo, Dorian Gray não acessa suas dores, sua condição humana; ou que seu duplo passa a viver o que ele deixou de viver.
*Ele não envelheceria, não sofreria, e para que isso acontecesse, tudo de ruim estaria no quadro.
*Para concluir, Dorian conseguiu viver este duplo com o pacto demoníaco.
*Com tudo isso que Dorian vive, é o retrato que sofre as dores e mudanças, começando com os bichos saindo do quadro, dos olhos, penso o que de tão podre ele não podia ver, e terminando com o quadro envelhecendo, ficando horroroso monstruoso.
*Ele esconde o quadro, sugerindo que ele não poderia lidar com estas situações e elas ficariam no retrato.
*Pode-se pensar também que o quadro é um duplo, que vive as questões que Dorian não pode assumir que sente.
*As partes sombrias de Dorian eram colocadas no retrato. Ele olha para dentro do quadro e o quadro para ele. O retrato parece que tem vida própria e o observa.
*Os seus sofrimentos e marcas da vida ficam no quadro, no seu duplo.
*Mas, podemos observar que este lado narcísico, obscuro e sombrio que nós não gostamos de olhar, se encontram em diversos graus em nós mesmos, ou em outras pessoas.
*Como nos percebermos e aceitarmos a nós como somos por inteiro? Para isso, precisamos encontrar uma condição mental que possa nos ajudar a pensarmos pensamentos antes impensáveis e lidarmos com emoções que nos pareçam insuportáveis, mas que fazem parte da nossa condição humana.
*Fonte: www.sbprp.org.br/cinema/dorian_gray.pdf
www.interseccaopsicanalitica.com.br
(*Sugiro o filme dirigido por Oliver Parker, (2009), com roteiro de Toby Finlay e estrelando Ben Barnes e Colin Firth. Baseado na obra The Picture of Dorian Gray, do escritor irlandês Oscar Wilde, o filme contra a trajetória do personagem principal, Dorian Gray, um atraente aristocrata inglês cujo retrato envelhece em seu lugar).
Ψ Fatima Vieira - Psicóloga Clínica
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